quarta-feira, 12 de novembro de 2014

O Beijo da Palavrinha

        Era uma vez uma menina chamada Maria Poeirinha. Ela vivia com a sua mãe, o seu pai e o seu irmão Zeca Zonzo. Eles nunca tinham visto o mar.
        Um dia, o seu tio Jaime Litorânio fez uma viagem pelo mar e, quando regressou, disse:
        - O mar abriu-me a porta para o futuro!
        O tio Litorânio achava grave não conhecerem o mar, pois o mar faz conhecer o horizonte, ter esperança e faz sentir que a espera vale a pena.
        Em certo momento, Maria Poeirinha adoeceu gravemente.
        O tio Litorânio dizia que a falta de mar tinha provocado a palermice do Zeca Zonzo, a doença de Poeirinha, a fome e a solidão. Ele afirmava:
        - Temos de levar a menina para ver o mar!
        Mas, infelizmente, a menina estava tão fraca e tão pálida que até não conseguia andar, de tão doente que estava. As pessoas já estavam a preparar as despedidas…. Porém, apareceu o irmão, Zeca Zonzo, que trazia um papel e uma caneta. Toda a gente pensava que ele ia desenhar o oceano, mas não. Ele desenhou, com letra grossa, a palavra “Mar”.
        Fez a irmã passar, por cima de cada letra, os seus dedos e disse-lhe:
        - Está sentindo, maninha? Que letra é esta?
        - É um “m”! – respondeu a Maria Poeirinha.
         O seu irmão confirmou:
        - Sim, é um “m”, que parece as ondas do mar.
        - Nós já vimos essas ondas, sim. Já as vimos no rio! – disse a sua irmã, toda emocionada.
        Depois, o irmão perguntou:
        - E, agora, que letrinha é esta, aqui a seguir ao “m”?
        - É um “a”!
        - Muito bem! É um “a” de ave, de uma gaivota que voa por cima do mar! – exclamou o Zeca Zonzo, que de “zonzo” não tinha nada.
         Ele perguntou novamente:
        - E esta, qual é?
        - É um “r”! – diz a Maria Poeirinha.
        O seu irmão disse:
         - É um “r” da rocha que está no mar azul.
         Entretanto, a Maria Poeirinha faleceu…
         Agora, quando o seu irmão olha para a sua fotografia, diz:
         - A minha irmãzinha morreu afogada na ternura de uma palavrinha, no beijo da palavra “Mar”.  


        Inês Leite – 4.º E – E.B. Devesinha
(Reconto da história: «O Beijo da Palavrinha», da autoria de Mia Couto)

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